sábado

Os valores estão todos invertidos…

O maior sonho na vida de qualquer casal é conseguir ser uma família com filhos. E ter a enorme — mas estimulante — responsabilidade de os educar.
A tarefa não é fácil. Exige de nós, pais, atenção e empenhamento permanentes, dedicação sem limites. É gratificante vê-los crescer, desenvolverem-se, adquirirem autonomia. Tudo projectado num futuro que, obviamente, desejamos que seja o melhor possível. Mas tendo em conta o mundo em que vivemos hoje as preocupações de qualquer pai crescem diariamente.
Cresci a aprender a ser responsável. Ainda muito jovem foi-me dada a responsabilidade de levar e trazer as vacas do pasto; ir levar recados e não me enganar no que ia dizer; chegar da escola, lanchar e ir fazer os trabalhos de casa, bem-feitos, para depois, sim, ir brincar.
Acima de tudo tive uma grande educação. Uma educação em que a responsabilidade foi um valor sempre presente.
As crianças de hoje são totalmente diferentes. O desenvolvimento adquirido cada vez mais cedo, em vez de utilizado numa aprendizagem melhor e o consequente ganho em cultura e educação, é gasto a aprender a jogar no computador, a mexer em telemóveis ou a jogar Playstation.
Afinal, que geração estamos a criar?  
Esta é uma questão que a todos os pais, sem excepção, deve ser posta. Para reflexão aprofundada. Tendo como pano de fundo a realidade dos nossos dias — uma realidade facilitista para os filhos e desculpabilizadora. Não lhes conseguimos dizer «não» a nada e aceitamos, passivamente, a inversão do tempo verbal no tratamento pessoal: o pai e a mãe tratam os filhinhos por você e eles, pequenitos, tratam-os por tu e outros termos idênticos, o mesmo acontecendo com os avós.
Senão vejamos:
O filhinho quer uma Playstation. Nós compramos.
O menino «berra» porque não quer comer a sopa, não a come e acaba na caixa das bolachas de chocolate.
O menino quer ir ao Mcdonald’s, nós compramos um «big-mac».
O menino quer camisola Adidas e ténis Nike, nós compramos porque a criancinha tem tanto direito como os colegas da escola.
À noite, o menino quer ficar a ver televisão até tarde. Embora cansados e com sono, nós ficamos ao seu lado no sofá e passamos-lhe o comando.
Entretanto, cresce. Faz-se projecto de homem ou mulher.
A então criancinha, agora mais crescida, começa a pedir a mesada e gasta uma boa parte do orçamento familiar em saídas, roupa de marca, jantares e bares.
Durante os estudos, às vezes passa de ano, outras nem por isso, mas não se pode pressioná-la porque, inventa-se, já tem uma vida stressante, de festa em festa e de noitada em noitada.
Entra, depois, na fase da rebeldia, exteriorizada por não liga patavina aos pais, põe a avó em sentido, suja e não lava, come e não limpa, desarruma e não arruma.
Na escola, o professor tenta pôr nos eixos a criancinha, mas, já crescidinha, fica traumatizada, sente-se vítima de violência da escola.
Então em casa, faz queixinhas aos pais e chora. Eles, condoídos com a violência sobre o filhinho, correm para a escola e espetam duas bofetadas no professor «que não tem nada que se armar em paizinho, pois quem sabe do meu filho sou eu».
Não é este um fiel retrato da realidade?
Os pais, hoje, protegem em demasia os filhos e vivenciam com eles sem hierarquia. Não têm que ser carrascos educativos, mas devem ter pulso firme para que a inversão dos valores não se registe. Mas não é isto que acontece.
Um dia destes, vão ser os paizinhos a ir parar ao hospital com um pontapé e um murro das criancinhas no olho esquerdo. Só não sei se este tipo de agressão, de filhos aos pais, fará parte das estatísticas oficiais dos crimes de violência doméstica.
É bom fazer uma reflexão sobre isto. Antes que seja tarde.
Vasco Rodrigues

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