sexta-feira

Acorrentado Estado de Direito

Ora, aqui está uma crónica que é uma delicia ler, mas, o mais grave dos problemas aqui mencionados, provavelmente, também se devem ao Dr. Juiz Rangel, pessoa por quem nutro muita admiração, só que escrever não basta, é preciso actuar e quando as situações gravosas, ou crimes de um grau bem elevado se deparam na sua alçada, o seu estado de julgar é o que se tem visto, os ricos, políticos, ou amigos dos políticos, esses processos, escapam-lhe por baixo da sua mesa de trabalho durante as audiências, ou julgamento, arrastando-se ao longo dos anos, até caírem no esquecimento e arquivando- se com a frase do costume « arquiva-se por falta de provas », quando por vezes elas são mais que evidentes.

Pena que não seja tal qual o que se transcreve, elaborado por essa personalidade, que tanto admiro.

O Estado de Direito fez-se para haver igualdade, liberdade e justiça.

 Não se fez para gerar cerca de meio milhão de desempregados, para fomentar a injustiça social e a desigualdade.
Não se fez para gerar mais pobres, mais excluídos, nem só para criar poucos e cada vez mais ricos.
Não se fez para os seus filhos terem um ensino degradante e em decadência, com falta de autoridade e de disciplina, onde o professor é o elo mais fraco da cadeia de interesses.
Não se fez para a saúde ser um bem raro e escasso, onde só alguns têm direito a serem tratados em condições de dignidade.
Não se fez para o Estado Social deixar de cumprir a sua função primeira de prestar apoio aos mais desfavorecidos.
Não se fez para que a classe média, já em vias de extinção, seja sempre a primeira a pagar a crise provocada por um Estado despesista.
Não se fez para que a crise seja sempre combatida à custa do aumento da carga fiscal, sacrificando sempre os mesmos.
Não se fez para que as pensões de reforma dos nossos idosos sejam de miséria.
Não se fez para que as empresas públicas paguem ordenados e prémios aos seus gestores que são "obscenos", que ofendem a moral e a ética republicana.
Nem Salazar se atrevia a tanto. O descaramento e a falta de vergonha dos gestores públicos não têm limites. Eles devoram e comem tudo e o Estado cúmplice olha para o lado. O Estado de Direito não se fez para gozar com a bondade e a passividade do ser português.
Não se fez para que os políticos se transformem em profissionais da política e se eternizem nos lugares, capturando a democracia ao não deixarem que a sociedade respire.
Não se fez para que Portugal continue a ter um índice de iliteracia e de analfabetismo dos mais elevados da Europa.
Não se fez para que a justiça esteja em crise desde há mais de trinta anos, com défices de credibilidade que a tornam num dos maiores falhanços da democracia.
Não se fez para que os políticos não gostem de ser investigados, escutados e escrutinados no respeito pela separação de poderes.
Não se fez para que se crie à volta da justiça uma crispação gratuita, que só serve os interesses instalados, devendo quem governa este povo fazer um exame crítico e analítico, interrogando-se porque é que os políticos estão no fundo da tabela da confiança do cidadão.
Não se fez para que a confiança e a auto-estima dos portugueses estejam nas ruas da amargura.
Não se fez para pactuar com o aumento da corrupção que mina o Estado, onde às segundas-feiras o governo dá mostras de querer combater este flagelo e às terças dá sinal contrário, para que tudo fique na mesma.
Não se fez para termos um legislador que é reincidente na criação de legislação oportunista e da fraca qualidade.
E não se fez para a judicialização da política nem para a politização da justiça.
O Estado de Direito foi capturado e está acorrentado, servindo os interesses dos mais ricos e poderosos. 

O Estado de Direito não é isto!!!
Rui Rangel, Juiz Desembargador

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