sexta-feira

Na terra do imaginário

(Se como diz a «Pedra Filosofal», poema escrito por António Gedeão e imortalizado pela voz de Manuel Freire, «o sonho comanda a vida», eu…)

Sonho com um mundo melhor, com o desenvolvimento da minha aldeia, da minha freguesia, do concelho e região em que se inserem. Mas…
Objectivo primeiro, nunca me desligar das minhas raízes: a terra onde nasci, dos amigos que por lá estão, da família que, obviamente, adoro, de toda aquela gente humilde que faz do trabalho no campo, de sol a sol, o seu dia-a-dia.
Discuto com todos, abertamente, sem reservas mentais, o meu ponto de vista religioso, cultural e político.
Ainda que à distância, entrego-me a uma luta silenciosa, todos dias, por uma visão promissora da terra que me viu nascer e por uma vida assente nos valores que ali adquiri. Com virtudes e defeitos, esta será a minha competição, uma guerra civilizada que impus a mim próprio.
Lutarei até à exaustão para salvar esses valores e, assim, ajudar a dar voz àqueles que têm vergonha ou falta de coragem para fazer reparos ao que está errado, ou receiam represálias por parte de pessoas que se julgam as donas do mundo.
Amo a minha terra, não me canso de a defender. Foi a minha terra que me ensinou o princípio de tudo o que sei hoje, foi uma verdadeira escola da vida. Foi lá que dei os primeiros passos, que aprendi a juntar as primeiras letras, que descobri tantos caminhos, que vi pela primeira vez a chuva, a neve e o sol, através das vidraças da janela. E foi lá, igualmente, que adquiri os valores da religião católica que professo.
Hoje, no céu, o meu Pai, estou convicto, estará feliz por ouvir-me e sentirá orgulho pelas lutas que travo. E, sobretudo, por verificar que a desistência não faz parte dos meus ideais.
Sou extremamente apegado às minhas raízes. Daí que viva com paixão os dramas da minha terra.
Procuro, na medida das minhas possibilidades, a tranquilidade na minha aldeia, fugitivo da violência moderna que marca as cidades.
Recuso parar no tempo e também não o posso parar. Por isso estou aqui, reforçando a vontade de quem me fez e me ensinou a caminhar. Sem desistir.
A essência da liberdade é dizer o que se pensa. Uma liberdade que, por vezes, poderá transcender os limites do possível. Mas é aí que me sinto melhor, nunca pondo em causa, no entanto, o seu limite. A liberdade não pode ter fronteiras, não deve estar agrilhoada. Ou se se quiser, o limite será onde começa a liberdade do outro. Que não deve ser invadida.
Tenho várias questões existenciais ou fundamentais. Talvez decorrentes dessa liberdade. De sentir. De estar. De pensar.
Pessoalmente entendo que é importante pôr em causa todas as questões e desenvolver o espírito crítico.
Questionar qualquer coisa, sem que isso seja um problema para nós e para os outros.
Desenvolver preocupações sobre qualquer assunto.
Não é preciso ser intelectual numa sociedade provinciana, argumentar que se tem poucos conhecimentos. É preciso avaliar o trabalho de quem os dirige e perceber que nós temos uma posição em consonância, coerente, com isso. Um pouco como aquele ditado «em terra de cego quem tem olho é rei».
Não quero perder a noção da realidade. Luto e faço um esforço para aprender todos os dias. Ou não seja a vida um percurso de aprendizagem constante.
Conheço muitos mais velhos no povo, gente simples, que são portadores de muitos e mais conhecimentos do que aqueles que  são considerados intelectuais.
E fico triste quando vejo aqueles que se escondem atrás das suas mediocridades para sobreviverem. Para esconder as suas raízes, porque querem ser mais «puros» que os outros. Mas nunca o serão.
É importante nunca tirar os pés do chão e não pensar que o sucesso de hoje se eterniza.
Só na «Terra do Nunca», do Peter Pan, é que os jovens não envelheciam.

in Gazeta de Sátão
Vasco Rodrigues

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